A Europa censura em favor de Israel

Crescem na Alemanha os casos de repressão a artistas e intelectuais que defendem os palestinos. São excluídos automaticamente de planos de fomento, escrachados e têm exposições canceladas. EUA e Inglaterra seguem o mesmo caminho…

Foto: Getty Images
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A reclamação dos artistas e intelectuais alcançou repercussão internacional graças a um artigo no New York Review of Books (19/10/2023) e uma reportagem no The New York Times (7 e 8/12/2023).

O artigo é assinado por Susan Neiman, de origem judaica, diretora do Einstein Forum, organização acadêmica com sede em Potsdam, ao lado de Berlim, voltada para a cooperação internacional. Nele, a autora deplora que o esforço por combater o antissemitismo descambou para uma às velada, às vezes ostensiva repressão contra quem manifeste críticas a Israel e ao governo israelense.

Uma das bases deste desvirtuamento estaria em resolução adotada pelo Parlamento Federal que considera qualquer forma de boicote a Israel como um ato antissemita; outra base seria também a consideração de que a segurança de Israel tornou-se uma “razão de Estado” na Alemanha, o que implica um apoio incondicional às ações daquele país e de seu governo. A partir daí, qualquer declaração ou ação de artistas ou intelectuais que propiciem uma acusação ou sequer suspeita de antissemitismo leva à exclusão dos autores dos planos de fomento – financiamento – público de atividades culturais, venham a acusação ou a suspeita de onde vierem. Aponta ela que esta prática vem ocorrendo já há alguns anos no país.

Casos

A reportagem do The New York Times lista uma série de casos de artistas que tiveram exposições ou premiações canceladas, ou suspensas por fazerem declarações consideradas hostis a Israel depois do ataque de 7 de outubro e da retaliação israelense em Gaza e na Cisjordânia ocupada. Também comparece à lista pelo menos um caso de artista que fez anos atrás uma declaração considerada hostil a Israel.

Um dos casos mais contundentes listados no jornal é o da artista judia sul-africana Candice Breitz que, por ter criticado a retaliação de Israel em Gaza, teve sua exposição, prevista para 2024, cancelada no estado de Saarland. Diga-se de passagem que a exposição nada tinha a ver com a questão palestina ou israelense, versando sobre prostituição na África do Sul.

O antissemitismo continua sendo um problema ora latente, ora explícito na Alemanha, assim como em outros países, e merece repulsa, assim como a islamofobia ou qualquer outra forma de discriminação racial, cultural, política, religiosa, de gênero ou ainda outras. O problema, aponta Neiman em seu artigo, é que esta preocupação vem descambando para o que chama de uma forma de “histeria” que promove ou aceita qualquer tipo de denúncia, com ou sem fundamento, como motivo suficiente para cancelar atividades ou personalidades de iniciativas culturais.

Artistas e intelectuais de origem judaica, além de outras e outros, têm se manifestado em favor do diálogo ao invés da exclusão. A ministra da Cultura alemã, Claudia Roth, também se manifestou em favor de uma maior tolerância, afirmando que a exclusão deva ser um último recurso, ao invés de algo liminar. Entretanto, o problema persiste, uma vez que curadores de arte e diretores de museus ou outras instituições culturais temem perder o apoio institucional caso alguma de suas atividades levante uma sombra de suspeita de antissemitismo.

Problema também em outros países

O problema não é só da Alemanha. Em novembro, o conhecido artista chinês Ai Wei Wei, que apoia as reivindicações dos palestinos, teve uma exposição em Londres cancelada porque seus patrocinadores consideraram que este não era “o momento oportuno” para fazê-la, diante de apreensões por ele formuladas sobre a situação dos palestinos na Faixa de Gaza. Disseram respeitar o artista, e que considerariam a conveniência de retomar a iniciativa em outra ocasião.

Nos Estados Unidos, denúncias da deputada do Partido Republicano por Nova York Elise Stefanik, uma entusiasta apoiadora de Donald Trump, levaram à convocação pela Câmara de três presidentas de universidades norte-americanas, Harvard, Princeton e o MIT, Massachussets Institute of Technoogy.

As três foram acusadas de não porem ênfase suficiente na condenação do eventual ou suposto antissemitismo em manifestações pró-palestinos entre seus estudantes. Em consequência, a presidenta da Universidade de Princeton, Elizabeth Magill, renunciou. A deputada republicana comemorou: “Uma já foi”. Há quem veja nisto o renascimento do macarthismo repressivo dos anos 50, de triste memória.

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